Daruê Zuri repensa o encarceramento a partir do legado de Sueli Carneiro

Com apenas 18 anos, Daruê Zuri foi o mais jovem participante do Programa de Residências da Casa Sueli Carneiro em 2024. A idade, no entanto, não impediu que sua proposta provocasse reflexões profundas sobre um dos temas mais urgentes da sociedade brasileira: o encarceramento em massa da população negra.

A partir do projeto Racismo e Encarceramento no Brasil, Daruê buscou compreender como o sistema penal brasileiro reproduz lógicas de exclusão racial. Embora já tivesse interesse pessoal pelo tema, foi com a residência que ele teve, pela primeira vez, contato com a obra de Sueli Carneiro.

“O auxílio financeiro foi essencial. Me deu tempo para mergulhar nas leituras, conhecer o acervo e construir minha pesquisa com mais profundidade”, relata.

Sob a mentoria de Ionara Lourenço, coordenadora de acervos da Casa, Daruê se debruçou sobre conceitos como epistemicídio, genocídio e violência estrutural, amplamente trabalhados por Sueli ao longo de sua trajetória. Embora o encarceramento não esteja no centro da obra da filósofa, os marcos teóricos e políticos que ela construiu foram fundamentais para que o residente pudesse traçar conexões com autores e autoras que se dedicam ao tema no Brasil.

“Quando Sueli fala sobre epistemicídio, sobre como a informação é ocultada de nós, isso me ajudou a entender o apagamento das nossas referências. Eu mesmo não conhecia o trabalho dela antes da residência”, afirma.

Além das leituras, a troca com os outros e outras residentes ampliou ainda mais seu repertório. Daruê destaca o impacto do trabalho de Maria Júlia (Maju), que pesquisa o papel das mulheres negras nas escolas de samba durante a ditadura militar. “Eu nunca tinha ouvido falar de mulheres negras perseguidas naquele período. A gente escuta falar de sambistas, mas não desse outro lado da história”, comenta.

Essa convivência o ajudou a acessar uma nova compreensão de memória negra, termo que até então não fazia parte de seu vocabulário. “O que eu tinha aprendido na escola eram memórias da escravização, não da nossa cultura, religião, arte, nem dos pensadores negros”, diz.

Ao longo da residência, Daruê também estudou Michel Foucault e passou a compreender o encarceramento como parte de um sistema de punições articulado com o racismo estrutural. As leituras foram nortadas pelo livro Dispositivo de Racialidade, de Sueli Carneiro (Zahar, 2023).

Ainda que não pretenda seguir pesquisando o tema do encarceramento em seus próximos projetos, Daruê deixa a residência com novas questões e horizontes de pesquisa. Ele agora se interessa por temas relacionados, como a relação entre facções, Estado e polícia, áreas que também revelam os mecanismos de controle sobre corpos e territórios negros no Brasil.

Residentes da Casa Sueli Carneiro em 2024

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